Construindo vazios que organizam a arquitetura em efeitos cênicos, o projeto do Studio Guilherme Torres para CASACOR Miami se apropria do branco para reinventar a volumetria do espaço
“O poema não é feito das letras que eu espeto como pregos, mas do branco que fica no papel”. O discurso do poeta francês Paul Claudel define com precisão o Miami White Hotel, projeto do Studio Guilherme Torres para a primeira edição da franquia CASACOR no sul dos Estados Unidos. “A ideia era construir o vazio e não o preenchido”, diz Guilherme sobre o espaço de aspecto aparentemente simples e asséptico, extremamente purista. A suíte do 43º andar, tão típica dos edifícios que brotam na região de Brickell, vai se revelando à medida em que o visitante interage com o espaço, de rigor técnico estratégico e alto efeito emocional.
Ao idealizar o ambiente, a primeira e mais intransponível das adversidades seria, pelas normas do edifício, não poder realizar ali uma única adaptação sequer, fosse remoção de paredes ou mesmo a substituição dos acabamentos despadronizados. Para compensar enquadramentos assimétricos, portas fora de escala e afins, os arquitetos recorreram às soluções cênicas de modo a redesenhar sua própria geografia de interiores. O perímetro foi totalmente reconfigurado, ora por meio de imensas cortinas que encapsulam as paredes, ora por uma segunda pele de treliças móveis com grandes aberturas geométricas.
A circulação também se dá de forma nada ortodoxa, sem obstáculos, com os próprios móveis delineando caminhos, sem nada encostado nas paredes. Entre mesas, bancos e apoios, mais de duas toneladas de mobiliário cruzaram o Atlântico especialmente para o evento – tudo com o selo NOS Furniture, marca da qual Torres é diretor criativo e que, portanto, acentua ainda mais a qualidade altamente autoral do projeto. Como elemento central, uma enorme cama ganhou ares de móvel híbrido com prolongamentos e encostos componíveis para situações de dormir, repousar, sentar, trabalhar ou fazer uma refeição – com a mesa anexa, por exemplo.
“Não defendo o discurso do branco – ainda mais num destino quente, tropical – e nem de qualquer outro matiz especificamente. Nunca associei nosso trabalho à zona de conforto do ‘color blocking’. Aqui a narrativa faz sentido para destacar a volumetria. Tratamos o branco como um estudo das massas arquitetônicas, da forma, do volume, sem entregar uma plástica totalmente pronta. A ideia é que as pessoas enxerguem as linhas que compõem nosso processo criativo”. Um ensaio sobre o preenchimento, uma valorização do vazio, como reza a métrica da melhor arquitetura contemporânea.
Sobre Studio Guilherme Torres
O grande laboratório criativo, erguido recentemente entre as esquinas da Rua João Moura com a Alameda Gabriel Monteiro da Silva veio para ressignificar a característica de Guilherme Torres transitar por todas as áreas, não se limitando a escalas, tampouco a somente projetos de arquitetura. Com um novo time de associados, produzem de edifícios a livros, de vídeos à design de objeto.
A missão desses jovens é movida pelo desejo – de redesenhar a cidade. Bons projetos tem a condição de melhorar a segurança, abrir espaços para convivência. “São Paulo e uma cidade de grades e muros, queremos romper estas barreiras. Arquitetura tem o poder de trabalhar a autoestima dos cidadãos”, cita Guilherme. Atualmente com projetos em todo o país, a empresa tem expandido seus horizontes para o mercado europeu e norte americano. Outro projeto é se envolver cada vez mais no mercado das artes, tanto desenvolvendo instalações quanto recebendo exposições temporárias na galeria do seu novo QG.